Desde o início de agosto, o café brasileiro enfrenta um obstáculo inesperado no mercado norte-americano. Com a tarifa de 50% imposta pelo governo Donald Trump ao Brasil, o setor tem buscado soluções para escapar do aumento abrupto de custos e da queda nas importações.
Uma das saídas encontradas é redirecionar o produto para o Canadá, onde as taxas não se aplicam. A manobra tem garantido algum alívio temporário às empresas, mas o impacto no preço final do café nos Estados Unidos já é evidente — em alguns casos, o aumento chega a 40% para o consumidor.
Tarifa afeta um terço do café consumido nos EUA
O café brasileiro sempre teve presença forte no mercado americano, representando cerca de um terço do consumo total. No entanto, desde 6 de agosto, quando o tarifaço entrou em vigor, importadores relatam custos mais altos, cargas paradas, contratos cancelados e dificuldade para manter o abastecimento.
Segundo a Reuters, os efeitos começaram a aparecer rapidamente: o café brasileiro, antes competitivo, passou a ser visto como um produto caro e arriscado.
Lucatelli Coffee envia café ao Canadá para escapar da tarifa
A empresa Lucatelli Coffee, sediada na Flórida, ilustra bem o novo cenário. Após comprar US$ 720 mil em café brasileiro, a importadora optou por armazenar o carregamento temporariamente e depois enviá-lo ao Canadá, evitando assim o pagamento da tarifa.
“É um dilema: esperar e torcer por um acordo comercial ou tomar um banho de sangue na logística para redirecionar o café”, afirmou Steven Walter Thomas, dono da empresa.
Embora o transporte adicional gere custos, o empresário explica que a economia ao evitar a tarifa de 50% compensa o gasto extra.
Contratos cancelados e estoques em queda
Enquanto aguardam uma possível negociação entre Lula e Trump, importadores e torrefadoras norte-americanas enfrentam baixa nos estoques e cancelamentos de contratos.
A Downeast Coffee Roasters, que fornece para supermercados e redes da Costa Leste, afirmou ter conseguido cancelar parte dos pedidos de café brasileiro. Mesmo assim, enfrenta dificuldades para encontrar substitutos.
“Temos estoques, mas eles estão se esgotando rapidamente”, disse Michael Kapos, representante da empresa.
Cafés de outros países, como Colômbia, México e América Central, subiram até 10% em preço desde o anúncio da tarifa, enquanto o café brasileiro caiu cerca de 5%, refletindo a redução da demanda.
Preço do café sobe 41% em um ano nos Estados Unidos
O impacto no bolso do consumidor é evidente. Segundo dados do governo americano, o preço médio do café torrado e moído subiu 41% em setembro, em comparação com o mesmo mês do ano anterior.
Parte dessa alta vem da queda na produção global — causada por eventos climáticos —, mas o novo imposto sobre produtos brasileiros agravou o cenário inflacionário.
Consumidores já notam a diferença nas prateleiras.
“Não estou mais olhando para as marcas, só procuro as ofertas”, disse Sherryl Legyin, cliente em um supermercado de Nova Jersey.
Outra consumidora, Yasmin Vazquez, também percebeu a mudança.
“Meu café instantâneo custava US$ 6 ou US$ 7, agora está sendo vendido por US$ 11. E parece que ficou menor”, contou à Reuters.
‘Tarifa é política, não comercial’, diz importador
A decisão de Trump de aplicar o tarifaço de 50% ao Brasil teve motivações tanto comerciais quanto políticas.
O ex-presidente americano acusou o Supremo Tribunal Federal (STF) de perseguir Jair Bolsonaro, seu aliado ideológico, após o julgamento que resultou em 27 anos de prisão para o ex-presidente brasileiro.
Enquanto isso, Trump e Lula retomaram o diálogo e se reuniram no último domingo (26). Lula afirmou estar otimista quanto à suspensão das tarifas, mas Trump evitou prometer um acordo.
Para o importador Steven Walter Thomas, a medida tem caráter punitivo.
“Não se trata de reciprocidade ou comércio — é política e pessoal. É entre Trump e Lula. O Brasil não está pagando, eu estou. Eu e meus clientes”, disse.
Setor cafeeiro pressiona por acordo comercial
Empresas dos dois países pressionam por uma solução diplomática rápida. O prolongamento da tarifa pode causar queda nas exportações brasileiras e encarecimento do produto nos EUA.
Enquanto isso, o Canadá e países europeus devem aumentar a importação de café brasileiro, aproveitando os preços competitivos e a qualidade reconhecida do grão.
O cenário mostra que o tarifaço afeta toda a cadeia, do produtor rural ao consumidor final, e transforma o café — símbolo da cooperação entre Brasil e Estados Unidos — em mais um ponto de tensão política internacional.
